A minha visao sobre o Debate do Orçamento do Estado - Jose Maria Neves

Tenho acompanhado, quando posso, as aulas na Universidade não me permitem fazê-lo como gostaria, os debates do Orçamento do Estado. Ambiente menos tenso, discursos mais elevados - a agressão física mútua que aconteceu há dias na Casa Parlamentar terá contribuído para amainar os ânimos? - o que é muito bom para a imagem da política e dos políticos.

Nov 30, 2018 - 05:56
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A minha visao sobre o Debate do Orçamento do Estado - Jose Maria Neves

1. Tenho acompanhado, quando posso, as aulas na Universidade não me permitem fazê-lo como gostaria, os debates do Orçamento do Estado. Ambiente menos tenso, discursos mais elevados - a agressão física mútua que aconteceu há dias na Casa Parlamentar terá contribuído para amainar os ânimos? - o que é muito bom para a imagem da política e dos políticos.

2. Há um ponto, todavia, assaz importante, que gostaria de realçar. Tem-se dito, espero que inconscientemente e, por conseguinte, sem intencionalidade, que, em 2016, o povo rejeitou os 15 anos do governo PAICV, que foi um desastre para Cabo Verde.

Ora, salvo devido respeito, o que o povo avaliou, em 2016, foi a legislatura 2011-2016. Os mandatos anteriores (2001-2005 e 2006-2010) foram, a seu tempo, a exame e passaram com distinção. O PAICV ganhou, com maioria absoluta, as eleições de 2006 e 2011, neste caso apesar da crise que já atingira o país, desde 2008. O desempenho foi globalmente considerado positivo pelo povo caboverdiano - que revalidou os mandatos -, e por instituições insuspeitas internacionais.

Em 2016, apesar dos ganhos - Cabo Verde cumprira no essencial os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio, passara a país de rendimento médio, ganhara dois Compactos do Millennium Challenge Account, e assumia todos os compromissos internacionais e tinha reservas externas suficientes para suportar o Acordo de Cooperação Cambial e a convertibilidade do escudo e as importações e sem quaisquer ruturas nas transferências e pagamentos dos salários, um pais de boa saúde, pois, com o equilíbrio dos fundamentais da economia -, o povo considerou que devia mudar de governo num processo normal de alternância democrática.

3. O PAICV não foi rejeitado pelo povo. Este atribuiu-lhe o papel de oposição democrática, tão digno como o de governar. Assim acontecera com o MPD, que depois de governar 10 anos, foi dignamente colocado na oposição, durante 15 anos, pelo povo. O fantástico da democracia é que quem é minoria hoje - havendo liberdade, espaço de dissenso e de contra-argumentação e justificação pública das políticas - amanhã poderá ser governo e vice-versa.

Tendo havido apenas alternância governativa, é tempo de naturalizarmos as mudanças de governo em democracia, reforçarmos a tolerância mútua entre os partidos e olharmos em frente, com os olhos fixos no bem comum. As políticas públicas são incrementais, acabamos sempre por construir sobre os alicerces deixados por aqueles que nos antecederam. Sabem que quem cobre a casa não pode desdenhar daqueles que fizeram os caboucos, colocaram os pilares e construíram as paredes.

4. A qualificação da democracia passa pela elevação do discurso. Perde-se e ganha-se em democracia, sempre com dignidade. Dito de outro modo: é preciso saber perder e saber ganhar, em ambos os casos com a magnanimidade que só a nobreza política concede.