Brava, o desenvolvimento invertido e o plano estratégico que ninguém conhece
Cidade de Nova Sintra, 6 de Novembro de 2024 (Bravanews) - Segundo o Presidente da Câmara Municipal da Brava, Francisco Tavares, em 2013, foi elaborado um plano estratégico ambicioso, que ninguém conhece, para o futuro da ilha, com quatro pilares. Centro de Saúde novo, ligação marítima diária entre Fogo e Brava, electricidade e abastecimento de água para todos.
No entanto, passados mais de dez anos, este plano tornou-se um dos maiores enigmas da administração pública local, dado que seu conteúdo permanece restrito a um círculo fechado de pessoas, com pouco ou nenhum acesso à informação detalhada sobre o que, de facto, está sendo feito para transformar a ilha. Um desenvolvimento cada vez mais descrito como uma "pirâmide invertida", onde os frutos do progresso parecem estar concentrados em áreas de menos impacto para a população, e a base dos problemas se alarga à medida que o tempo passa.
O "Plano Estratégico da Brava" foi, inicialmente, visto como uma grande promessa para a ilha. Segundo informações não oficiais, o objetivo era impulsionar o crescimento de sectores chave como a agricultura, o turismo e os serviços básicos, oferecendo condições para uma melhor qualidade de vida à população bravense. No entanto, anos depois, o plano permanece envolto em sigilo, com pouquíssimos detalhes compartilhados com o público. A crítica maior recai sobre a falta de transparência e o distanciamento da administração local em relação aos anseios da comunidade.
Enquanto isso, a realidade que os habitantes da Brava vivem hoje está longe de ser a que foi prometida. De acordo com muitos moradores e especialistas, o desenvolvimento da ilha parece seguir a lógica de uma pirâmide invertida, onde os investimentos, embora em áreas visíveis, não conseguem resolver as questões estruturais e mais urgentes da região.
Uma das áreas que mais desperta atenção é o investimento em infraestrutura desportivas. Embora a Brava tenha recebido algumas melhorias significativas em termos de placas desportivas e outras estruturas voltadas para a prática de desporto, a verdade é que essas obras não têm conseguido sustentar a criação de uma cultura de desporto activo na ilha. O número de atletas que utilizam essas instalações é cada vez menor, e muitos questionam a necessidade de continuar investindo em áreas onde a prática desportiva tem pouco apelo, especialmente em uma ilha onde outros problemas mais urgentes, como o desemprego e a falta de oportunidades, são palpáveis. Tanto investimento em infraestruturas desportivas para termos o resultado palpável da não realização do campeonato regional de futebol.
A ilha, que no passado foi marcada por uma agricultura forte, agora vê sua base produtiva diminuir a cada ano. As terras cultiváveis estão cada vez mais escassas, e o número de agricultores activos diminui drasticamente. Muitos dos terrenos que antes eram utilizados para cultivo estão sendo negligenciados, enquanto os jovens da ilha preferem procurar oportunidades fora da região. A Brava, que já foi uma grande produtora agrícola, vive agora uma crise no sector primário, enquanto o seu futuro passa a ser ameaçado por falta de trabalhadores mais qualificados.
Em termos de infraestrutura básica, há também avanços que merecem reconhecimento, como a expansão do abastecimento de água, que agora cobre 100% da população. Contudo, enquanto o fornecimento de água se normaliza, a crise da agricultura e a escassez de terras cultiváveis tornam cada vez mais difícil a manutenção de um ciclo de vida sustentável para a população. O que antes era uma das grandes fontes de subsistência da ilha, agora parece estar em vias de extinção.
Em relação à eletricidade, a Brava experimentou uma melhoria no fornecimento, mas o aumento dos custos e a dificuldade de muitas famílias em pagar as facturas de energia elétrica tornam este avanço quase irrelevante para grande parte da população. Apesar do aumento no fornecimento, a realidade é que muitas famílias bravenses vivem em constante dificuldade para honrar suas contas, uma situação que piora a cada ano devido à inflação e à falta de políticas sociais mais eficazes.
O setor de saúde também segue em uma trajetória de contradições. Foi anunciado o projeto de construção de um centro de saúde moderno, mas, até agora, os equipamentos básicos continuam em falta. Não há infraestrutura adequada para atender a uma população crescente, e muitos moradores se veem forçados a viajar para a ilha de São Filipe, ou até mesmo para Santiago, em busca de serviços médicos mais especializados. O novo centro de saúde, que deverá representar uma melhoria substancial para a qualidade de vida, acaba se tornando apenas mais uma promessa vazia de mudança.
Outro ponto de crítica é a questão da emigração. Se antes a Brava era um destino de pessoas vindas de outros países em busca de melhores condições de vida, hoje ela é uma ilha marcada pela saída constante de seus próprios filhos. A falta de oportunidades de trabalho e de um plano real de desenvolvimento econômico tem levado muitos jovens a deixar a ilha em busca de melhores condições de vida, principalmente para países da Europa e América.
Em 2023, um estudo informal apontou que mais de 40% dos jovens entre 18 e 30 anos haviam emigrado nos últimos 10 anos. Este fenômeno é uma das maiores ameaças ao futuro da ilha, pois a juventude é a base de qualquer transformação social e econômica. Com a emigração, a Brava vê seu potencial de crescimento desvanecer-se, ao passo que os poucos jovens que ficam acabam se deparando com um mercado de trabalho saturado e uma escassez de empregos qualificados.
O futuro da Brava parece ser uma encruzilhada. A ilha ainda possui um enorme potencial para o turismo e para a agricultura, mas a forma como as políticas públicas têm sido implementadas nos últimos anos tem gerado mais frustração do que progresso real. O segredo por trás do plano estratégico de 2013, guardado a sete chaves pelo Presidente da Câmara Municipal, Francisco tavares, precisa ser revisto e, acima de tudo, apresentado ao público.
A população bravense, cansada de esperar por promessas que nunca se concretizam, exige maior transparência e uma actuação mais assertiva dos governantes locais. A ilha precisa de um novo impulso que não se resuma a obras isoladas e a promessas não cumpridas, mas que envolva um esforço genuíno de reestruturação econômica e social.
Em tempos de crise, as soluções não podem ser apenas medidas pontuais. O que a Brava precisa é de uma estratégia sólida e de longo prazo, que valorize seus recursos humanos, seus produtos locais e, acima de tudo, que devolva a confiança da população em um futuro melhor. Sem isso, o desenvolvimento da Brava continuará sendo apenas mais uma pirâmide invertida, onde as bases do progresso parecem sempre estar fora de alcance.
Pelas Brava, pelas pessoas, parece ser um lema oco, pois as mesmas pessoas estão, na sua maioria, dizendo frustradas com mentiras, promessas ocas e vazias, vagas e sem conteúdo qualquer. Talvez se mudássemos, pela Brava e por alguns, cairia melhor no actual contexto.