Carta aberta ao Sr. Procurador-Geral da República: Que o Dr. Amadeu Oliveira prove as suas acusações
Como integrante do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de Cabo Verde, mesmo sem ter sido mandatado para o efeito, não poderia, de modo algum, deixar de tomar posição em relação às graves acusações que têm sido desferidas por estes dias contra esse Tribunal e os seus juízes, pelo Advogado Dr. Amadeu Oliveira.
Como integrante do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de Cabo Verde, mesmo sem ter sido mandatado para o efeito, não poderia, de modo algum, deixar de tomar posição em relação às graves acusações que têm sido desferidas por estes dias contra esse Tribunal e os seus juízes, pelo Advogado Dr. Amadeu Oliveira.
Reajo por imperativo ético e com a mesma tranquilidade de consciência com que, já em Julho passado, quando esse Advogado começou a escrever missivas à Sua Excelência o Presidente da República e aos demais Órgãos de Soberania, com ataques à minha reputação pessoal e profissional, decidi meter-lhe logo uma queixa-crime e exigir de imediato ao Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) um rigoroso inquério à minha actuação como Juiz Conselheiro do STJ, para apurar da veracidade das suas acusações.
Por isso mesmo, fiz também saber na altura ao CSMJ que os resultados desse inquérito, (repito, exigido por mim!), deveriam ser amplamente divulgados, deixando bem claro que, se viesse a ser verdade aquilo de que eu era pessoalmente acusado pelo Dr. Amadeu Oliveira, não me restaria outra alternativa, que não fosse enfrentar com hombridade as minhas responsabilidades.
Com efeito, desde o berço e da minha adolescência no meio das gentes do mar, cuja intrepidez foi a minha escola, aprendi que, não é fugindo, mas sim, agarrando o touro pelos cornos, como se costuma dizer, que temos que lidar com situações dessas.
Será uma autêntica catástrofe para a Justiça em Cabo Verde, para o futuro do nosso País, para a Terra em que os nossos filhos terão que viver, se nos acobardarmos e permitirmos que esse Advogado se imponha a todos nós pelo medo.
Infelizmente, o meu solicitado inquérito ao CSMJ nunca veio.
Isso não me impede de estar perfeitamente à vontade para me pronunciar sobre aquilo que, já tinha alertado, iriam ser novos desenvolvimentos, provocados por essa obsessiva motivação: manipular a Comunicação Social e a opinião pública e criar, artificialmente, um quadro negro em torno da Justiça Cabo-verdiana, sobretudo do STJ, para emprestar aparência de verdade àquilo que se vai afirmando.
O resultado está, infelizmente, à vista: devido à crónica dificuldade de comunicação da Justiça, à sua timidez, à incompreensível hesitação e inabilidade em desmontar, de pronto, inverdades e calúnias, aquilo que se tinha por uma mera questão da morosidade da justiça, comum a todas as Democracias, acabou por entrar na agenda, com foros de verdade, como uma questão da integridade moral da Justiça Cabo-verdiana, em especial do STJ e dos seus juízes, o que suscita uma generalizada e compreensível inquietação, como temos estado a assistir.
Correndo já atrás do prejuízo, resta contudo saber quais as verdadeiras razões que estarão por detrás desse profundo ódio que o Dr. Amadeu Oliveira vem nutrindo pelo STJ e pelos seus juízes.
Do mesmo modo, é preciso saber de que “aldrabice” estará a falar esse Advogado quando, com a sua inquestionável autoridade moral, aponta o seu dedo acusador aos Juízes do STJ.
Mais do que isso: é importante que se conheça certos expedientes utilizados para ganhar causas que só não resultam em verdadeiras “aldrabices” porque os Juízes do STJ são pessoas de bem, honestas e de integridade moral.
É o que proponho demonstrar e comprovar, se necessário for, perante qualquer instância ou autoridade.
Vejamos então.
Após a posse do novo colectivo do STJ, em Novembro de 2015, um dos primeiros processos que a Secção Criminal teve que julgar foi exactamente um recurso vindo de Santo Antão, a impugnação de uma prisão preventiva por indícios de crime de homicídio voluntário ocorrido na Zona de Caibros da Ribeira Grande, em que o arguido-recorrente era patrocinado pelo Dr. Amadeu Oliveira, que pugnava pela inocência e a imediata soltura do seu constituinte.
Examinado o processo e os argumentos apresentados, a Secção Criminal do STJ decidiu pelo acórdão nº 57/2016 que a prisão preventiva tinha fundamento na lei e era de se manter, pelo que o recurso foi julgado improcedente.
O recorrente, através do Advogado Dr. Amadeu Oliveira, suscitou a nulidade do acórdão, arguindo omissões e insistindo na sua imediata soltura.
Até aqui está-se perante o exercício normal dos direitos processuais do Arguido.
Na verdade, quem discordar de um acórdão do STJ pode reagir suscitando nulidades e/ou até recorrer para o Tribunal Constitucional, invocando inconstitucionalidades. É por essa via, e não com calúnias na Comunicação Social, que se impugnam decisões judicias.
Se o STJ estiver errado no seu julgamento, o que pode acontecer, não só em Cabo Verde, mas também em Portugal e em todo o lado, corrige-se o erro com humildade e repõe-se a legalidade.
É o pleno funcionamento das efectivas garantias de defesa que a nossa Ordem Jurídica, fundada na Constituição da República de 1992, proporciona a todos os cidadãos/arguidos e que devem ser usadas pelos interessados na plenitude.
O que já não se pode admitir, por ser contrário à Lei, à Ética e à Moral, e a tudo aquilo que o próprio Dr. Amadeu Oliveira tem vindo a apregoar nas suas intervenções, é que se pretenda a todo o custo obter ganho de causa nos Tribunais, se necessário for, assediando, pressionando e intimidando os juízes que vão decidir.
Por isso, não é de se aceitar que, em paralelo ao exercício dos direitos processuais, o Advogado do arguido, esteja a escrever individualmente aos juízes suplicando “os seus bons ofícios” no sentido de se proferir uma decisão que lhe é favorável.
É claro que, indiferente a tais súplicas, o STJ acabou por indeferir a reclamação deduzida e confirmar a sua decisão de manter esse arguido, repito, indiciado por crime de homicídio voluntário, em prisão preventiva, como é de lei, igual para todos!
Ora, a partir daí o Dr. Amadeu Oliveira imbui-se de um ódio visceral pelo STJ que o leva a acusar os seus juízes de “aldrabice”, “só para manter um pobre coitado na cadeia”, como aconteceu no último debate televisivo sobre o “Estado da Justiça”.
Razão para se lhe perguntar: de que “aldrabice” estará a falar? Será mesmo aldrabice dos Juízes do STJ?
Sim, porque aldrabice no STJ só poderia acontecer, se se permitisse que os expedientes do Dr. Amadeu Oliveira conduzissem aos resultados por ele esperados, o que representaria, por certo, o colapso moral do Poder Judicial entre nós.
O Dr. Amadeu Oliveira, apesar desse seu poder de retaliação, que intimida todo o mundo, da sua influência indisputável junto da Comunicação Social, em especial da Televisão Pública de Cabo Verde, do seu fácil acesso ao centro do Poder, até para exigir uma “vassourada geral no Conselho Superior da Magistratura Judicial”, deve ficar ciente de que “ainda há juízes em Berlim” e homens e mulheres de verticalidade na Justiça.
É certo que, como já é público e notório, a calúnia é o elevado preço que teremos de suportar na nossa honra para, com espírito de missão, preservarmos a independência, a seriedade e a integridade moral do Poder Judicial no nosso País.
Mas, ainda assim, apesar do dever de reserva e de contenção que se lhe impõe, a Magistratura Cabo-verdiana não se pode acobardar, nem permitir que a honorabilidade dos Juízes esteja a ser lentamente consumida pelo lume brando das pérfidas suspeições suscitadas pelo Dr. Amadeu Oliveira.
Afinal, é, antes de mais, a dignidade e a respeitabilidade do nosso País e a integridade das suas instituições judiciárias que estão em causa.
Por isso mesmo, e porque, quem não deve, não teme, o Dr. Amadeu Oliveira é publicamente desafiado a entregar sem demora ao Ministério Público as provas de crimes cometidos pelos Juízes do STJ, para que contra os prevaricadores seja de imediato instaurado o competente procedimento criminal.
Da minha parte, como já fizera saber ao CSMJ, de consciência absolutamente tranquila e de cara levantada, estou pronto para responder a qualquer momento e perante qualquer Autoridade pelos factos que me vierem a ser imputados.
Entretanto, até lá, continuarei a exercer as minhas funções de Juiz Conselheiro do STJ, com dignidade e muita honra, com independência, serenidade e firmeza, lamentando apenas três coisas:
Primeiro, que aquilo que deveria ser um sério, sereno e profundo debate sobre o “Estado da Justiça” em Cabo Verde, com o envolvimento de outros segmentos da Comunidade Jurídica, e não apenas os advogados, tenha sido aproveitado, qual fogueira da Inquisição, para se queimar o bom nome dos magistrados e das instituições, sem que aos visados fosse dada a menor chance de se defenderem.
Segundo, que os magistrados do nosso País estejam completamente abandonados à sua sorte, sem qualquer protecção do Código Penal e do Estado, através do Ministério Público. Na verdade, em vez de estarem a despachar processos, cada vez mais complexos, sujeitos a apertados prazos, os magistrados têm de andar a correr atrás de advogados, como eu tive que fazer, para defenderem a sua honra e dignidade nos Tribunais, quando são insultados e caluniados por causa do exercício das suas funções.
Terceiro, que o Senhor Procurador-Geral da República não tenha decidido desde a primeira hora pela abertura de um rigoroso inquérito para se apurar a veracidade das denúncias que o Dr. Amadeu Oliveira tem vindo a fazer, e agir em conformidade, deixando que graves suspeições continuem a pairar sobre a integridade moral dos Juízes do STJ, sem que os mesmos se possam defender.
Na verdade, ou a denúncia é fundada, e os prevaricadores devem ser processados; ou a denúncia é infundada, e o seu autor criminalmente responsabilizado.
Ninguém deve estar acima da lei em Cabo Verde! Nem os Juizes Conselheiros do STJ, nem o Dr. Amadeu Oliveira.
Expresso das ilhas