Turismofobia alastra pela Europa
Abriu a caça ao turista em várias cidades europeias. Hordas de visitantes deixam os locais em fúria e têm levado as autoridades a apertar-lhes o cerco
Abriu a caça ao turista em várias cidades europeias. Hordas de visitantes deixam os locais em fúria e têm levado as autoridades a apertar-lhes o cerco.
O turismo de massas está em ponto de rebuçado para a explosão social. Há manifestações, cartazes ameaçadores, pedidos para limitar os visitantes e queixas sobre aumentos exponenciais das rendas de casa e do custo de vida. Os residentes dizem que lhes tomaram as cidades de assalto e isso levou os governantes a agir. Um pouco por todo o mundo, sucedem-se as medidas para pôr o turismo na ordem.
BARCELONA
Com 32 milhões de visitantes registados no ano passado, a cidade catalã está a transbordar. Os locais deixaram, pura e simplesmente, de andar nas ramblas ou de fazer compras no conhecido mercado La Boqueria, onde os comerciantes se queixam de haver só turistas que não gastam um cêntimo, apenas tiram fotos. Os navios de cruzeiro que despejam milhares de turistas diariamente, e que apenas passam algumas horas a vaguear, levaram a autarquia a equacionar um imposto de €0,65 por cada turista que passe menos de 12 horas na cidade.
Alda Colau, a presidente da câmara local, foi taxativa, mal tomou posse: “Se não queremos acabar como Veneza, temos de impor limites.” Foi o que fez. Em janeiro deste ano entrou em vigor uma moratória que proíbe novas licenças para a construção de hotéis e travou também a emissão de autorizações para apartamentos turísticos.
Nas ruas há frases pichadas nas paredes para “mimar” os turistas: “Gaudí odeia-te”; “Para de destruir a nossa vida”: “Turistas voltem para casa, bem-vindos, refugiados”; “Chega de estrangeiros”. Mas também alguns mais ameaçadores: “Porque é que lhe chamam época do turismo se não podemos matá-los?”
Nos últimos dias, duas ações do movimento separatista catalão Arran (nasceu em 2012 com a união de várias organizações de jovens independentistas) puseram a “turismofobia” a circular na net. Num dos vídeos veem-se alguns membros a furar os pneus de bicicletas alugadas por turistas; noutro, vários mascarados obrigaram o motorista de um autocarro turístico panorâmico, com passageiros, a parar. Furaram um dos pneus e escreveram no vidro da frente a frase “o turismo mata os bairros”. Alguns turistas pensaram tratar-se de um ataque terrorista.
O movimento antiturismo alastrou a outras cidades espanholas. Para o dia 17 de agosto está convocada uma manifestação contra a “turistificação” em San Sebastián, no País Basco, onde está a ser estudada uma lei para limitar a construção de hotéis. Em Palma de Maiorca, os protestos também se têm feito ouvir e ler: várias paredes têm escritos como “voltem para casa”.
LONDRES
Os alugueres através da plataforma Airbnb foram limitados a 90 dias por ano, por cada imóvel.
BERLIM
Desde maio de 2016 que as plataformas de aluguer de alojamentos de curta duração, como o Airbnb, o Windu ou 9Flats, deixaram de poder funcionar na capital alemã. A nova lei permite apenas alugar quartos a turistas, mas não apartamentos. Quem não cumprir arrisca-se a pagar uma multa que pode ir até aos 100 mil euros. A decisão foi tomada depois de um aumento de 56% do valor das rendas.
VENEZA
Todos os dias há mais turistas do que locais. Vivem cerca de 50 mil habitantes na cidade dos canais, mas desembocam diariamente 60 mil visitantes. Qualquer coisa como 21,9 milhões por ano, muitos deles chegando através dos enormes navios de cruzeiro. No ano passado começaram a surgir cartazes: “Turistas vão-se embora! Vocês estão a destruir Veneza.” Este ano a autarquia decidiu agir. Proibiu a abertura de novos restaurantes de fast food e instalou contadores automáticos de pessoas nas zonas mais populares. A limitação de visitantes diários no centro histórico está a ser analisada. Em julho, pela primeira vez, foi limitado o número de pessoas que puderam assistir a um festival local.
FLORENÇA
Mangueiradas preventivas. A câmara decidiu “regar” com regularidade as escadarias das praças e igrejas com água e sabão para evitar que os turistas se sentem nelas para beber e comer.
MILÃO
Proibiram-se as garrafas de plástico, latas e selfie sticks numa das principais áreas da cidade, o Bairro dei Navigli.
ROMA
O mau comportamento dos turistas levou a que 37 seguranças zelem, agora, pelas principais fontes da capital. Tomar banho ou sentar-se ao redor para comer e beber dá multa de €240. Uma das mais conhecidas, a Fonte de Trevi, pode vir a ter um número limitado de visitantes, assim como outros locais emblemáticos da cidade.
DUBROVNIK
Na cidade croata está a ser analisada a hipótese de limitar a entrada diária de cruzeiros. Atualmente podem atracar cinco navios por dia, mas as autoridades querem reduzir o número para dois. A explosão de visitantes, cerca de 10 mil por dia, em muito se deve à série A Guerra dos Tronos, cujas principais cenas foram aqui filmadas. Para já foi imposto um limite de seis mil visitantes por dia.
SANTORINI
As enchentes de mais
de 10 mil pessoas por dia, nomeadamente devido aos cruzeiros, fizeram com que as autoridades gregas limitassem, na ilha, o número de visitantes a oito mil por dia.
Amesterdão Foi assinado recentemente um acordo com a Airbnb (plataforma eletrónica de aluguer de casas) que impede os proprietários de arrendarem os seus imóveis durante mais de 60 dias por ano.
NÓS POR CÁ
Com tantas queixas na praça pública, a Câmara de Lisboa começou a tomar medidas limitativas. Desde 1 de agosto que os autocarros turísticos ocasionais estão proibidos de circular na zona da Sé e do Castelo de São Jorge (os panorâmicos não estão incluídos). Mas foram os tuk-tuks os primeiros a ser alvo das lamentações lisboetas. Desde outubro de 2015 que algumas ruas da zona do Castelo de São Jorge foram interditas a estes veículos, e o horário de circulação passou a ser das 9 às 21 horas. Mas está em falta a completa regulação. O Regulamento Municipal (impõe que estes veículos sejam elétricos e que haja terminais permanentes obrigatórios) deveria entrar em vigor em setembro, mas o vereador Manuel Salgado já admitiu que a decisão final só será tomada depois das eleições autárquicas.
A Câmara do Porto já deu este passo. Em junho entrou em vigor a nova lei para os transportes turísticos – autocarros, tuk-tuks e minitrain –, que passam a ter locais próprios e paragens sinalizadas, percursos e horários definidos (entre as 9 e as 20 horas). Não podem circular nas faixas BUS, nem estacionar nas paragens dos transportes coletivos.